“Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é Amor!” (I Jo 4, 8)
Ao lermos ou ouvirmos este versículo da Sagrada Escritura pode passar despercebido por nós o que está contido nele escondido pela sua simplicidade. Mas, ao o contemplarmos e meditarmos, nos deparamos com a frase “Deus é Amor”. Às vezes, mesmo assim, sua simplicidade nos engana e não percebemos então o que nos está sendo dito: Deus que é onipotente, onisciente e onipresente é amor, então esta é também a identidade do amor; sua medida e seu poder não têm limites. E não percebemos principalmente devido ao mau uso que a palavra amor tem sofrido atualmente – além de banalizada, esta tem sido abusada e distorcida, fazendo com que seu sentido e sua essência se percam – e pela ideia errada que temos de quem é Deus quando o vemos como um ser distante de nós, castigador, vingativo e opressor.
Então, o que é o amor? Esta palavra se torna de difícil definição, pois engloba em si realidades e relações bastante diferentes, que foram classificadas pelos gregos antigos em: Eros (fundamentado na atração física, amor sexual), Philia (fundamentado na mutualidade, amor fraternal, amizade), Storge (fundamentado na similaridade, amor entre familiares) e Ágape (amor livre, gratuito, altruísta e incondicional; expresso na Bíblia também pela palavra caritas, caridade). Temos a perfeita definição para o Amor Ágape deixada pelo apóstolo Paulo: “O amor é paciente, o amor é bondoso. Não tem inveja. O amor não é orgulhoso. Não é arrogante. Nem escandaloso. Não busca seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (I Cor 13, 4-7). É este amor que é Deus e que Ele tem por nós. O amor que ama sem distinção ou preferência, pelo contrário, ama a todos e a cada um, especialmente o excluído, o pecador, o sofredor, o desprezado, o miserável, o menor dentre todos. É também este amor que Ele nos chama a ter por Ele e pelo próximo quando nos diz “O primeiro de todos os mandamentos é este: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu espírito e de todas as tuas forças. Eis aqui o segundo: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Outros mandamentos maior do que estes não existe” (Mc 12, 29-31).
Ao idealizarmos esse Deus distante, castigador, vingativo e opressor cometemos um grande pecado contra Ele, pois dessa forma não percebemos que Ele é amor e não percebemos que esse amor é presente, demonstrado a nós através de atos concretos. Deus já nos deu a conhecê-Lo como amor e nos ensinou a amá-Lo e amar ao próximo da mesma forma, manifestando-Se entre nós. Este foi o Seu maior ato de amor. Jesus, o próprio amor, através de sua vida, paixão, morte e ressurreição nos ensinou a também ser amor. E como fazê-lo? Atendendo o chamado que Ele fez aos primeiros discípulos e renova a cada dia a nós: “Vinde e vede” (Jo 1, 39). Ou seja, para aprendermos a ser amor como Jesus é, basta apenas que vivamos com Ele, contemplando, meditando a Sua vida e procurando imitá-Lo, ser outro Cristo.
Assim, Ele nos ensina que a base do verdadeiro amor é sair de si, esquecer de si mesmo e doar sua vida pelo próximo, assim como Ele o fez saindo de junto da Trindade Santa e dando Sua vida por nós. Ensina-nos também que o verdadeiro amor é livre e gratuito, fazendo-o exclusivamente por amor ao Pai e aos homens. Ensina-nos ainda que o amor só é perfeito se for um ato de amor a Deus, dirigido ao homem mas impulsionado e fundamentado no amor a Deus que vence todas as tribulações e limitações. E ainda, um ensinamento fundamental: quem ama verdadeiramente se faz humilde, se humilha, se faz o mais indigno, se faz servo, se faz o mais pobre, se faz escravo, o menor dentre todos. É impossível amar verdadeiramente se nos sentimos superiores, se somos orgulhosos, pretensiosos, preconceituosos. O perfeito amor que é Deus não ama dessa forma, portanto se amarmos desta forma não estaremos amando como Deus, impulsionados pelo amor que temos a Ele.
À primeira vista pode nos parecer impossível, mas Deus nos criou a Sua imagem e semelhança e nos deu Seu Santo Espírito. O Espírito Santo, dom de Deus, derrama em nossos corações o primeiro dom, que contém todos os demais, o amor. O primeiro efeito desse dom é a remissão dos pecados que nos restitui à imagem e semelhança divina e nos faz nascer para uma nova vida em Cristo. Por isso, Deus nos chama ao amor, é esta a nossa maior vocação. Jesus teve também uma vida de oração e assim devemos imitá-Lo, pois através da oração contemplamos o amor, somos moldados a Ele, consentimos em acolhê-Lo e absorvê-Lo para então retribuir a Deus na vida terrena com o amor que, pela graça de Deus, o Espírito Santo derrama em nós. Pois quem ora se reconhece como pecador, pequeno, miserável, pobre, servo, escravo diante do Amor misericordioso de Deus e, portanto, é especialmente amado por Ele.
Que através da Sagrada Escritura, da oração e da Comunhão nos unamos ao amor uno e trino, deixemos que esse amor seja gerado espiritualmente em nossos corações, estejamos em comunhão e sejamos um só com Ele, e assim poderemos exclamar, assim como São Francisco: “Quem és tu, Senhor, e quem sou eu!” Nos unamos a Ele também através do último ensinamento deixado a nós: Cruz e Ressurreição. Quem ama como Jesus, sofre assim como Jesus, pois a Cruz foi a maior expressão do Seu amor. Mas, ao tomarmos nossa cruz e unirmos o nosso sofrimento ao de Jesus, temos também a certeza da vida eterna e gloriosa junto da Trindade Santa que é a vitória de quem amado por Deus, O ama e ama Seu próximo por amá-Lo em retribuição.
“A caridade deu-me a chave de minha vocação. Compreendi que a Igreja tinha coração, e que o coração era ardente de Amor. (…) Compreendi que o Amor abrange todas as vocações, alcançando todos os tempos e todos os lugares. (…) Ó meu Jesus, minha vocação, encontrei-a afinal: MINHA VOCAÇÃO É O AMOR!” (Santa Teresinha do Menino Jesus).
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